A Filosofia é um ramo do
conhecimento que pode ser caracterizado de três modos: seja pelos conteúdos ou
temas tratados, seja pela função que exerce na cultura, seja pela forma como
trata tais temas. Com relação aos conteúdos, contemporaneamente, a Filosofia
trata de conceitos tais como bem, beleza, justiça, verdade. Mas, nem sempre a
Filosofia tratou de temas selecionados, como os indicados acima. No começo, na
Grécia, a Filosofia tratava de todos os temas, já que até o séc. XIX não havia
uma separação entre ciência e filosofia. Assim, na Grécia, a Filosofia
incorporava todo o saber. No entanto, a Filosofia inaugurou um modo novo de
tratamento dos temas a que passa a se dedicar, determinando uma mudança na
forma de conhecimento do mundo até então vigente. Isto pode ser verificado a
partir de uma análise da assim considerada primeira proposição filosófica.
Se dermos crédito a Nietzsche, a primeira
proposição filosófica foi aquela enunciada por Tales, a saber, que a água é o
princípio de todas as coisas [Aristóteles. Metafísica, I, 3].
Cabe perguntar o que haveria de filosófico na
proposição de Tales. Muitos ensaiaram uma resposta a esta questão. Hegel, por
exemplo, afirma: "com ela a Filosofia começa, porque através dela chega à
consciência de que o um é a essência, o verdadeiro, o único que é em si e para
si. Começa aqui um distanciar-se daquilo que é a nossa percepção
sensível". Segundo Hegel, o filosófico aqui é o encontro do universal, a
água, ou seja, um único como verdadeiro. Nietzsche, por sua vez, afirma:
"a filosofia grega parece começar com uma
idéia absurda, com a proposição: a água é a origem e a matiz de todas as
coisas. Será mesmo necessário deter-nos nela e levá-la a sério? Sim, e por três
razões: em primeiro lugar, porque essa proposição enuncia algo sobre a origem
das coisas; em segundo lugar, porque o faz sem imagem e fabulação; e, enfim, em
terceiro lugar, porque nela, embora apenas em estado de crisália [sic], está
contido o pensamento: ‘Tudo é um’. A razão citada em primeiro lugar deixa Tales
ainda em comunidade com os religiosos e supersticiosos, a segunda o tira dessa
sociedade e no-lo mostra como investigador da natureza, mas, em virtude da
terceira, Tales se torna o primeiro filósofo grego".
Trecho
extraído de artigo redigido pelo Prof. Dr. Delamar José Volpato Dutra
[UFSC/CNPq]. Disponível em http://www.cfh.ufsc.br/~wfil/delamar1.htm